Wednesday, August 30, 2006

Lucky Number Slevin - Há Dias de Azar ***

O thriller de Paul McGuigan rege-se por dois príncipios, estilo e entretenimento. O primeiro está assente na escolha do cast, nos diálogos etimolo-filosóficos à la Tarantino e numa produção artística marcante. O segundo, num enredo bem construído, cheio de humor, acção e tensão quanto baste.
Onde peca Slevin é talvez no factor novidade pois torna-se numerosa a lista de filmes com o tipo de enredo "quem é quem" que a película apresenta. No entanto, há um factor que me parece relevante e onde reside, sem dúvida, a mais valia do filme. A passagem de um registo mais humorístico - à Guy Ritchie - para um registo mais violento - à Tarantino -, algo que acontece com o decorrer do filme. Esta metamorfose acontece especialmente na personagem principal, Slevin, muitíssimo bem conseguida por Josh Hartnett (uma surpresa).
Quanto aos três "reis magos" deste cast, leia-se: Morgan Freeman, Bruce Willis e Ben Kingsley, o "ouro" está em Ben Kingsley, numa personagem afectada mas extremamente bem construída quer pelo actor, quer pelo argumentista.
Num pequeno aparte, é uma pena que dois excelentes actores (Mykelki Williamson e especialmente, Danny Aiello) sejam desaproveitados, pois o seu inegável talento merecia mais do que uma cena.
Quanto a Lucy Liu, encheu o ecrã com a sua beleza e espontaneidade.
Um bom filme que tem passado ao lado de muito gente.

Sunday, August 27, 2006

Profissão: Repórter ****

Este excelente filme de Michelangelo Antonioni prima por tudo o que nos faz "amar" o cinema italiano.
O ritmo lento com que nos apresenta as personagens, deixando-nos olhar para as suas expressões, inteirando-nos dos seus sentimentos.
O desenrolar lento e misterioso dos propósitos da história.
A importância dada a todos os pormenores que tornam "deliciosas" as cenas da vida quotidiana.
O modo como todas as cenas são apresentadas de uma forma contextual em relação à situação geográfico-cultural. (É extraordinário a forma como Antonioni nos apresenta no início de várias cenas, personagens absolutamente típicas da cultura latina rural.)
Os seus planos de câmara são absolutamente estrondosos, como é o caso do plano final de zoom por uma janela.No entanto, esta obra de Antonioni não se fica pelas imagens, há diálogos absolutamente geniais como o conhecidíssimo: "Conheço-o melhor pelas perguntas que me faz do que você a mim pelas respostas que lhe der."
São inúmeras as razões pelas quais nos devemos obrigar a ver estas obras e apesar de requerem maior esforço e atenção, são, sem dúvida, experiências cinematográficas inesquecíveis.

Super-Homem - O Regresso *

Super-Homem volta a Metropolis após cinco anos de ausência.

O filme de Bryan Singer promete mas não cumpre.
Apesar do excelente casting, a mais recente película da saga Super-Homem revela um argumento e realização fracos, algo surpreendente tendo em conta os antecedentes do cineasta/argumentista.
O filme começa muitíssimo bem, com uma boa construção das personagens, excelentes pormenores de realização e um desenrolar da história absorvente. No entanto, após a primeira grande cena de acção - a queda de um avião -, o filme perde-se, as personagens estagnam e a realização e argumento "metem baixa". Aliás, redundância existente no argumento e cinematografia da segunda metade do filme são de tal ordem que parece estarmos diante de uma repetição de cenas anteriores.
Este declínio é ainda acentuado pelas inexplicáveis duas horas e meia que Bryan Singer demora a contar uma história que tem pouco de novidade.
Até a escolha criativa por um vilão que evolui de frio e calculista para algo mais desastrado e inábil parece-me indicativa dessa curva descendente que acontece no novo Super-Homem.
Como alguém disse: "O mais importante num bom filme de super-heróis é o vilão" e neste caso, nem o excelente Kevin Spacey conseguiu que Lex Luthor parecesse um adversário à altura do Super-Homem.
Por outro lado e pela positiva, há a realçar a conseguida actuação de Brandon Routh, uma agradável surpresa deste estreante nas grandes lides de Hollywood.
Em suma, o novo Super-Homem - O Regresso revela-se uma completa desilusão e não deixa saudades.

Saturday, August 19, 2006

Miami Vice - ****

James 'Sunny' Crockett (Colin Farrell) e Ricardo Tubbs (Jamie Foxx) são detectives da DEA (Drug Enforcement Agency) e encontram-se infiltrados numa complexa rede de tráfego de estupefacientes.

Felizmente para nós e para Michael Mann que este pôde levar avante o seu sonho de transpor a série Miami Vice - que produziu - para o grande ecrã.
Este excelente thriller de Michael Mann assenta em dois pilares, realismo e humanismo.
O realismo encontra-se na parte técnica do filme, isto é, realização, fotografia, edição, etc. O humanismo está embrenhado em todo o argumento.
Será esta fórmula nova para Michael Mann?
A visão de Michael Mann deste novo Miami Vice é, sem dúvida, semelhante às suas obras anteriores. E mais uma vez, tal como nas obras anteriores, resulta.
A importância dada ao "canvas" paisagístico está lá (como na Los Angeles de Heat e de Colateral). O realismo e menor definição nas cenas de maior tensão, também está. Os filtros azuis... A ausência de banda sonora nas cenas de acção de forma a não as romantizar... etc. Podia enumerar mil e uma semelhanças em termos técnicos com os seus restantes filmes mas "bottom line", resulta.
O argumento também é típico de Michael Mann mas atípico de Hollywood, centrando a história não na "big picture" (acção e drogas) mas na novela de sentimentos que envolve as personagens. E não tenham dúvidas, esse é o segredo de um grande filme de acção. Este filme, como em quase todo o bom cinema americano, prescinde de dar uma maior importância à acção espectacular (sem conteúdo, apenas visual) para se centrar na acção argumentativa (com conteúdo). Esta política minimalista, de que todas as cenas têm de ter uma função na história, é vital para que não haja quebras de ritmo.

Passando aos intérpretes, a grande surpresa é, sem dúvida, Colin Farrell. O actor irlandês, que andava perdido em personagens mal concebidas como em O Novo Mundo de Terrence Malick ou em Alexandre, O Grande de Oliver Stone, conseguiu imprimir à sua personagem uma dualidade entre frieza e proximidade, fundamental para a revelação do humanismo de 'Sunny' Crockett. Em suma, deu-lhe complexidade.
Jamie Foxx, por outro lado, pode parecer desaproveitado mas é a sua actuação contida que permite perceber que não é em Ricardo Tubbs mas sim em 'Sunny' Crockett que se encontram as encruzilhadas sentimentais do filme. Como tal, deverá ser este último a ocupar o plateau.
Quanto ao elenco secundário, nada a dizer. Ninguém sobressaí pela positiva ou pela negativa e era isso que se pretendia. A história principal eram as difíceis escolhas do protagonista e foram exactamente essas que saíram reforçadas com a contenção do cast secundário. Em suma, tudo o resto - acção, personagens, locais, etc - remeteu-se para segundo plano, deixando que os sentimentos se exteriorizassem tomando conta do espectador.
Michael Mann prova mais uma vez que é um dos cineastas que melhor gere a sua carreira, apresentando uma paixão inerente a cada projecto que faz.